quinta-feira, 25 de dezembro de 2008

PROJETORES - Crepúsculo: Vampiros que jogam beisebol

Crepúsculo (Twilight, 2008) é um filme adolescente para adolescentes. E quase exclusivamente, adolescentes do sexo feminino. Não que isso seja ruim, não é. E definitivamente o filme não é ruim. Mas olhando aqui e ali, podemos perceber que Crepúsculo tinha muito potencial, que infelizmente não foi explorado. E quem, como eu, leu o livro entende melhor ainda do que eu estou falando.

É inegável que a obra literária na qual o livro é baseado conquista, em sua maior parte, o público adolescente, mas acredito que ele possa encantar pessoas das mais variadas gerações. A autora Stephenie Meyer se utiliza muito inteligentemente de elementos como o romance proibido entre uma humana e um vampiro e toda uma nova mitologia acerca de vampiros e lobisomens para envolver o leitor numa atmosfera psicológica e num clima de suspense que dão o tom à obra e prendem a atenção até o fim, explorando a dualidade (temos o vampiro Edward Cullen que jamais machucaria a sua amada Bella Swan, mas luta constantemente contra o intenso desejo de mordê-la. Do outro lado temos Bella, que se sente atraída pelo vampiro e também sente um desejo estranho em ser mordida). E é essa ambivalência que permeia toda a história que a torna tão cativante. A narrativa de Meyer é vigorosa e tem um frescor que contagia os leitores. Mas, sobretudo, é uma trama adolescente. Os livros de Stephenie Meyer também são vistos como livros voltados para o público feminino. É fato que a maior fatia de seus leitores é composta por mulheres e não apenas adolescentes como se apregoa. Mulheres mais velhas também se interessam pela história da garota anti-social, nerd, responsável e madura para sua idade que vai morar com o pai numa cidadezinha obscura e fria e se apaixona por um vampiro charmoso, gentil, inteligente, mas perigoso, o que a torna mais negligente consigo mesma, impulsiva e inconseqüente.

Acho que os livros de Meyer (nem todos da série Crepúsculo são necessariamente bons livros como o primeiro) têm muitos méritos literários. A decisão acertada de fazer a protagonista ser a narradora, faz com que o diálogo com os leitores seja mais aberto e natural. Temos acesso a todas as emoções e conflitos internos da personagem e, pelo seu ponto de vista, tentamos decifrar os misteriosos personagens que se envolvem com ela. Assim sabemos tanto quanto ela sobre as pessoas a sua volta. Os impulsos, desejos, tiques e loucuras de uma garota normal de 17 anos estão presentes na narração. Por isso não dá pra cobrar muita formalidade quando são as palavras de uma adolescente que estão lá. É claro que as limitações são inevitáveis, quando se trata de narrativas em primeira pessoa.

Contudo, o filme, certamente, não apresenta uma força narrativa como a do livro, capaz de encantar gerações diferentes. Eu até posso apostar que ele estará datado dentro de alguns anos. Catherine Hardwicke é uma diretora acostumada a dialogar com o público adolescente bem como a lidar com seus dilemas, sempre criando personagens fortes. Isso é o que provam filmes como Aos Treze e Os Reis de Dogtown.

Catherine não é tipo de diretora que não cumpre o que promete isso porque ela não promete muito mesmo e isso é bom, pois no meio de tantos cineastas pedantes, é bom ver que ela prefere apostar na simplicidade e entregar filmes mais, digamos, sinceros. Pode até não ser uma grande cineasta, mas é uma diretora cheia de boas intenções, pelo menos. Os filmes de Catherine nunca ofendem, mas também não causam comoção. Mas valem pela simplicidade e despretensão da diretora.

O filme Crepúsculo é de longe a mais ambiciosa de suas apostas, levando-se em conta todo o hype criado em torno do romance vampiresco. E se ela não foi tão bem sucedida na transposição da história de Meyer para as telas, foi no quesito bilheteria. Pelo menos, com tudo o que o filme já faturou até aqui (uma quantia bem superior ao seu orçamento, pouco mais de 30 milhões de dólares), a seqüência tem chances de ser bem melhor no que diz respeito ao visual.

O principal demérito do filme é exatamente o visual, afinal sendo uma aventura fantástica, nesse campo é fundamental investir. Mas o que vemos são efeitos ruins, que dão a impressão de obsoletos, inferiores aos utilizados nas séries televisivas da Warner Bros. Aqui, pelo menos, o orçamento baixo justifica. Mas não justifica o roteiro, que não é de todo ruim, mas além de alguns diálogos óbvios, parece que foi escrito apenas para fãs da obra literária, sem se importar muito com quem nunca ouviu falar em Crepúsculo antes de ir conferir o filme. Ainda assim, em alguns momentos, o filme é capaz de decepcionar os fãs por deixar algumas passagens do livro de fora de sua versão em película. E isso não tem nada a ver com purismo. O fato de ela estar de salto ou não na hora do baile ou de não mencionarem o plano de viagem para Seattle (que no livro acaba não levando mesmo para lugar algum), ou a casa da família Cullen não ser branca não interessam. Mas a passagem em que Bella se sente mal na aula sobre tipagem sanguínea deveria estar no filme, afinal sua aversão a sangue seria uma coisa interessante a ser mostrada levando-se em conta o destino da personagem. O passado de Carlisle também merecia uma seqüência, até para introduzir os Volturi (que serão personagens de grande importância nas seqüências desse filme) na história, mas em nenhum momento eles são citados. Os momentos de romance entre Bella e Edward no quarto da garota, em que ele começa a testar o seu controle e descobrir até onde pode ir com Bella sem machucá-la também foram deixados de lado. Serviriam não apenas para acabar um pouco com a aura de castidade tão comentada, mas como uma experiência de descoberta entre os dois, o que remeteria logicamente para a descoberta dos desejos na adolescência, algo tão passível de identificação. O vilão James assim como no livro é o ponto fraco o filme. Introduzido apenas no final da história, perseguindo Bella por motivos simplistas o que acaba levando ao clímax do filme: a luta entre ele e Edward, um conflito, que por ironia, é bem anticlimático. Rápido demais e sem grandes emoções. Até agora também não entendi aquela câmera trêmula de Hardwicke, principalmente na seqüência do beijo.


O excesso de mel certamente incomoda muita gente, mas pelo menos o romance mostrado na tela é bastante sincero. Não existe metáfora, é uma história de amor com algumas passagens que realmente valem à pena, como a cena na clareira, ou quando o casal vai parar em cima das árvores ao som da lindíssima "Bella’s Lullaby" de Carter Burwell, um dos pontos altos do filme. A fotografia é primorosa. Claro, que os efeitos não ajudam, aliás, atrapalham bastante as cenas, que poderiam ser mais encantadoras se estes fossem mais eficientes. Outra seqüência interessante é aquela em que Edward apresenta a namorada a sua família. Rende boas tiradas.

O elenco todo está muito bem. Tanto os amigos de Bella que se mostram muito naturais em seus papéis, desajeitados e graciosos, quanto os Cullen que contornam a bizarrice da maquiagem excessiva e se entregam aos seus personagens com muita sinceridade, à exceção de Nikki Red. Billy Burke está perfeitamente caracterizado como o pai de Bella, injetando simpatia no recluso chefe de polícia Charlie Swan. Taylor Lautner faz o que pode para angariar a simpatia do público em suas poucas cenas como Jacob, para já ir acostumando o público, visto que ganha grande destaque na continuação, Lua Nova. E, talvez o ponto mais alto do filme seja mesmo o casal protagonista. A química entre Robert Pattinson e Kristen Stewart contribui muito para que o filme funcione. Stewart muito eficiente e graciosa como Bella Swan e Pattinson se apresenta charmoso e expressivo como Edward Cullen. Aliás, ele já havia se mostrado encantador em Harry Potter e o Cálice de Fogo.

Cenas que podem parecer gratuitas para quem não é leitor de Crepúsculo, como as quedas de Bella Swan, correspondem bem a sua personalidade. E funciona também como um contraponto entre a humana frágil e o vampiro forte. Outra cena muito criticada e tida como gratuita até para alguns leitores do livro é a do Beisebol. Até pode ser que Meyer tenha se inspirado no Quadribol de Harry Potter, mas no filme a cena não incomoda e nem compromete. E ao som de Muse com "Supermassive Black Hole", ela chega perto de se tornar divertida. Aliás a trilha sonora, inclui ótimas musicas. Além das já citadas, há também "Full Moon" do The Black Ghosts, "Flightless Bird, American Mouth" do Iron and Wine, "Eyes on Fire" do Blue Foundation e "Go All The Way With Me" de Perry Farrell.

Apesar de tudo dá para encarar Crepúsculo como uma diversão passável que não compromete. A cena de abertura já vale.

Vamos ver como vai ser Lua Nova. Afinal, as expectativas agora são boas. Chris Weitz do ótimo O Grande Garoto e de A Bússola de Ouro (que tem seus problemas, mas é bem dirigido e conta com um visual excelente) assume a direção no lugar de Hardwicke, o que pode garantir bons efeitos especiais e um clima maior de aventura, aproximando mais os não-fãs do livro, por torná-lo mais acessível a estes. E levando-se em conta o orçamento do próximo, Weitz tem chances de fazer um belíssimo trabalho construindo cenários fantásticos mais grandiosos. O próximo também não se prende tanto ao romance de Edward e Bella, mostrando mais a amizade entre a garota e Jacob e um leve início de atração e envolvimento entre eles. Há a introdução dos lobisomens que pode ser visualmente interessante e garantir boas cenas de ação, há cenas na Itália, a aparição dos Volturi, a rivalidade declarada entre lobisomens e vampiros, a grande vilã da história que agora tem reais motivos para ir atrás de Bella e mais desenvolvimento de Alice, uma personagem encantadora. Ou seja, tem chance de ser bem melhor que esse. Esperamos que o roteiro que ficará a cargo da mesma Melissa Rosemberg de Crepúsculo também sofra um up grade e fuja mais da obviedade e do excesso de mel.


E para os fãs algumas surpresinhas deliciosas: há uma passagem em que Bella derruba a maçã e Edward consegue pegá-la oferecendo-a a garota com as duas mãos, o que claro, remete a capa do livro. Ainda estão lá as comparações que Bella faz de Edward a super heróis, o diálogo do "leão se apaixona pelo cordeiro", a canção de ninar de Bella e a troca de olhares no final entre o vampiro Edward e o futuro lobisomem Jacob, que além de inimigos naturais, terão uma rivalidade ainda mais acentuada nos próximos filmes, devido a disputa pelo coração de Bella.

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